GASTRONOMIA

Feira vegana atrai público diversificado em Campo Grande

"Feira Veg" oferece cardápio vegano à preços acessíveis

Júlia Paz, Juliane Grisoste e Rafaela Fernandes16/08/2016 - 09h43
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A “Feira Veg”, aberta há seis meses na Praça dos Imigrantes, no centro da capital, é um evento popular, com preço acessível dos alimentos. A feira segue o modelo de outras feiras que existem no Brasil, nas quais para trabalhar é preciso ser vegano ou seja, pessoas que não consomem produtos de origem animal, há mais de um ano.  Os idealizadores Ed Wassouf, Rapha Rabello, Ana Paula Mavignier e Igor Padovan, montaram um grupo de cozinheiros veganos, que trabalham com reuniões semanais para planejar os produtos que serão ofertados aos sábados.

De acordo com um dos idealizadores do evento, Ed Wassouf, o público que comparece a "Feira Veg", em sua maioria, não é vegano. "Os consumidores são pessoas que, mesmo adquirindo produtos de origem animal se interessam pelo veganismo. Com divulgação, reuniões e oferecendo cada vez mais produtos diferentes, diversificando, a gente ganhou um público”. O técnico em medição hidráulica, Rodrigo Silva, 33, afirma que conheceu a feira por meio de amigos. “Não sou vegano, mas gosto da comida porque é de boa qualidade, são gostosas e a causa é boa. Eu acho aqui um ambiente muito agradável, é um lugar bom para ficar e interagir com os amigos”.

Para Wassouf, o diferencial da feira é oferecer produtos de qualidade e informar os benefícios dos alimentos ao público. “A gente seleciona os produtos, pesquisa e oferece essa informação, o que muitos locais com opções veganas não fazem”. Ele afirma que a expectativa é conseguir fazer da feira um local onde as famílias e amigos gostem de se reunir. "Sempre oferecer no final de semana uma opção para as pessoas, antes de saírem, para as famílias e para confraternização. Aqui é um lugar que já virou um ponto de referência. A praça dos imigrantes era um lugar que não tinha eventos, um lugar abandonado do centro”.

Os alimentos mais vendidos na "Feira Veg" são os derivados de jaca, de queijo vegetal e os doces. Wassouf relata que “cada um possui seu produto principal, de sua especialidade. A Duda com sanduíche de carne de jaca, os meus são os pães italianos e salgados com queijo vegetal, da Valéria são os doces integrais, sem glúten, da Bruna são os cupcakes, do Igor e da Ana são empadas de carne de jaca”. 

A chef de cozinha da ''Casa do Luís'', Thabata Borine, 27, é vegana desde o começo deste ano e afirma que a ideia de ter um cardápio amplo no restaurante da família é fornecer todos os tipos de comida a todos os públicos. “Montar um lugar que desse a chance de todos comerem seria uma boa. Aqui é um espaço onde todos se sentem incluídos, até os intolerantes a glúten, lactose". 

O restaurante funciona há quatro meses e de acordo com Thabata Borine, a procura maior é das pessoas intolerantes a glúten e lactose. "Sempre atendemos vegetarianos ou veganos, mas percebemos que nossa idéia agradou muito a quem não pode comer alguns ingredientes”. Thabata Borine critica o excesso de industrialização dos produtos e acredita que esta é uma das causas do aumento das doenças relacionadas às carnes e laticínios. "Um frango, por exemplo, cresce em vinte dias para ser consumido, o mesmo ocorre com vacas leiteiras, que para produzir mais leite recebem hormônios. Acaba que o leite da caixinha vem misturado com muitas coisas".

Para a chef, embora o número de estabelecimentos tenha aumentado, o número de veganos é ainda muito baixo. “Nós somos a capital com menos pessoas que aderem ao veganismo. As pessoas consomem muita carne no estado, aqui ela é muito barata.’’ Thabata Borine explica que existem alguns benefícios do veganismo para o meio ambiente e para a saúde. "Quando você se torna vegano, aprende o quanto a pecuária faz mal ao meio ambiente. A pecuária é a indústria que mais polui no mundo, os poluentes, a água utilizada com os animais, o espaço. Comecei a tentar ser uma pessoa melhor para o meio ambiente. Também acredito que o veganismo seja mais saudável por você ter que buscar tudo mais natural possível, isso ajuda bastante. Meu corpo funciona melhor agora, na digestão e ajudou muito minha gastrite”.  

Paulo Renato Benites é dono da “Vegvélo”, empresa que produz e oferece delivery de marmitas e lanches veganos em Campo Grande há mais de um ano. O projeto foi criado devido à falta de opções veganas na cidade.“Ter um trabalho que eu goste de fazer e no meio disso eu vi que não existia opção na cidade, de entrega, com preço acessível”. Ele afirma que a procura cresceu desde o ano passado. "Criamos receitas de hambúguer e demos a cara à tapa, fomos pra rua. Cresceu bem no começo, porque ninguém esperava. Aqui na cidade poucos lugares que pensavam no veganismo, só tinha o Espaço Ahara".

A proposta de Benites é trabalhar com comida vegana a preço acessível. “Se você for em um lugar com cardápio vegano, 80% das vezes o preço da comida é lá em cima e a gente não consegue entender o porquê disso. Os grãos, legumes são muito mais baratos do que um pedaço de carne”. Ele comenta que os lanches da "Vegvélo" começaram a ser vendidos por R$ 7. “A demanda cresceu muito e a gente começou a fazer marmita, porque não existia marmita vegana na cidade ainda e agora a ‘Vegvélo’ tem dois empreendimentos, trabalhamos com almoço de segunda a sexta e voltamos com uma nova linha de hambúrgueres, levando para vários locais da cidade em nossa Kombi”.

Difundir a alimentação vegana com preço acessível também é proposta do Instagram “Vegana Pobre”, administrado pela acadêmica de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Bárbara de Almeida e pela publicitária Kassandra Delvizio. Elas deixavam de comer em restaurantes para economizar, em 2014, quando estavam com dificuldades financeiras. “As pessoas não acreditavam que gastávamos R$ 50,00 por semana, incluindo todas as refeições. Então o Instagram ajuda a galera que acha que a alimentação vegana tem que ser cara, e como estamos em uma crise, o pessoal quer economizar, pegam dicas bacanas de cardápio. Quando você busca informação, você começa a descobrir coisas novas”. 

O processo de adaptação alimentar, nos dois últimos anos, para Bárbara de Almeida “envolve não só o hábito alimentar, mas muitos outros, como o uso do couro no vestuário por exemplo. Além disso, não temos industrializados baratos. Você tem que ir se adaptando, se fosse só alimentação era fácil. Fomos melhorando com o tempo, não é de um dia para o outro”. Nesse tempo, Kassandra Delvizio emagreceu 24kg e Barbara de Almeida, 17kg. “A nossa perda de peso é uma consequência, porque não comemos mais nada que possui gordura. No reino vegetal não existe colesterol ruim, ele vem da origem animal e se você corta isso, a chance de ter um AVC é mínima.’’

Barbara de Almeida comenta que os adeptos ao veganismo em Campo Grande ainda é pequeno, existem muitas pessoas favoráveis à causa. “A economia do estado é voltada para a produção de matéria-prima e temos a terceira população bovina do país. É uma média de 8,5 cabeça de gado por ser humano aqui no estado. O hábito é majoritariamente onívoro, é nadar contra a maré. Então por mais que a gente apresente dados da Organização Mundial da Saúde, elas acham que somos as extremistas, radicais.’’

O estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em outubro de 2015, onde a carne processada como salsichas, hambúrgueres e bacon, aumentam o risco de câncer e estão inclusas no grupo de substâncias mais perigosas para a saúde, junto ao cigarro, o plutônio e o ar contaminado. A carne vermelha também é apontada como fonte de câncer.

A maior parte das conclusões se baseiam em estudos epidemiológicos realizados em vários países. Os estudos mostram que a carne está associada a uma maior incidência de câncer colorretal, cerca de 18% a cada 50 gramas consumidos e a carne vermelha também está associada ao câncer de pâncreas e próstata.

Segundo os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), o câncer é responsável por 106,3 mortes por 100 mil brasileiros e os problemas com aparelho circulatório é de 168,9 óbitos por 100 mil. Juntas, estas doenças matam por ano, cerca de 542 mil pessoas só no Brasil.

O consumo elevado deste tipo de alimento foram elencados em outro estudo de Harvard, que durou 30 anos para concluir os riscos das gorduras saturadas no organismo. As gorduras substituídas por óleos de origens vegetais, nozes e sementes, reduzem a probabilidade de morte por doenças cardíacas, respiratórias, câncer, Parkinson e Alzheimer. 

O veganismo é uma alternativa viável de um estilo de vida. A nutricionista Thália de Paula comenta que uma alimentação sem carne, tem relação com a diminuição da incidência de doenças cardiovasculares e coronarianas. “As mudanças tendem a vir com o tempo, a longo prazo, entre os vegetarianos e veganos é possível encontrar melhores níveis de LDL, chamado colesterol ruim, diminuição do peso corporal, menores incidência de hipertenção e diabetes por exemplo”. Já a curto prazo “citam a melhora do paladar, da função intestinal, do aspecto e odor das fezes, além da melhora física e mental, da aparência, textura da pele, cabelo e unhas”.

A nutricionista aponta que os indivíduos saudáveis, de todas as idades, podem ser veganos e recomenda que aqueles que querem aderir ao estilo de vida devem procurar a ajuda de um profissional e fazer exames do estado geral de saúde. “A alimentação vegana pode ocasionar riscos se ela tiver desequilibrada, assim como qualquer outra, mesmo aquelas que as pessoas consomem carne e produtos de origem animal”. 

O indivíduo que optar por esse tipo de alimentação deve se atentar aos sinais do corpo, segundo ela, "o organismo tende a se adaptar às mudanças que a gente provoca através da alimentação e do estilo de vida, mas é importante que se escute o que o corpo fala. O corpo fala através da fome, da saciedade, da sede, vontade de ir ao banheiro, doenças, fadiga, sintomas de hipoglicemia. Todos são sintomas de que algo não vai bem”. 

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