Para a enfermeira Glauciene Cruz, os profissionais da saúde passam por um processo de sensibilização e humanização. "A gente trabalha para que a mulher receba um bom atendimento nosso, para que a situação dela seja resolvida. Se não resolveu aqui na Unidade Básica de Saúde (UBS), podemos encaminhá-la para um setor de referência, o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), que possui psicólogos e psiquiatras que podem ampará-la".
Glauciene Cruz atua na UBS Pioneiros, na capital
(Foto: Lucas Castro)
A enfermeira relata que, ao receber as notificações de violência, é preciso analisar a situação da mulher e da família para que o atendimento seja o mais adequado e acolhedor. "Analisamos o contexto social que está se passando, como ela está vivendo, se o marido ainda vive com ela, entre outras coisas. Quem faz a visita é o assistente social. Quando não tem assistente social, o enfermeiro faz uma visita domiciliar para essa mulher".
Dados da violência
O Brasil está entre os países com maior índice de homicídios femininos (feminicídios), com uma taxa de 4,8 assassinatos em 100 mil mulheres. O país ocupa a quinta posição em um ranking de 83 países, segundos dados do Mapa da Violência de 2015: Homicídio de Mulheres no Brasil.
Entre 2001 a 2011, ocorreu uma morte a cada uma hora e meia, de acordo com levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em 2015, de acordo com balanço feito pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Mato Grosso do Sul é a segunda unidade federativa com maior taxa de relatos de violência no Ligue 180.
Curso “Atenção à mulher em situação de violência”
O curso foi planejado pela Subsecretaria de Políticas Públicas para Mulheres do Estado de Mato Grosso do Sul (SPPM/MS), Secretaria de Estado de Saúde (SES) e Maternidade Cândido Mariano com o propósito de incluir diversas áreas que atuam na rede de atendimento à mulher, que abrangem aspectos jurídicos, psicológicos, sociais, políticos e de atenção à saúde.
As aulas estão disponíveis no portal do Telessaúde, núcleo de Mato Grosso do Sul. O projeto faz parte do programa “EmPENHAd@as pela Saúde” e foi idealizado pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do TJMS.
Elaborado por Adrian Albuquerque, com informações do Telessaúde
Segundo a enfermeira e coordenadora estadual do Telessaúde, Deisy Zanoni o principal objetivo do curso é oferecer atenção humanizada, para que a vítima sinta-se acolhida nos serviços. "A nossa expectativa é que haja uma sensibilização dos profissionais que atuem com mulheres em situação de violência a realizarem uma escuta qualificada e atenta para reconhecer as possíveis situações de violências. É necessário também que estes conheçam os serviços de apoio à mulher nessas condições, o modo de buscar apoio jurídico, assistencial e psicológico dentro da rede de atendimento".
Subsecretária da SPPM/MS, Luciana Azambuja
(Foto: Adrian Albuquerque)
De acordo com a subsecretária da SPPM/MS, Luciana Azambuja o curso foi focado para a área da saúde porque, na maioria dos casos, o profissional de saúde é o primeiro a ter contato com uma mulher violentada. “Às vezes, ela não vai para uma delegacia de polícia e não procura outra pessoa. Ela precisa de alguém da saúde. Então, entendemos a necessidade de tentar fazer com que esse profissionais compreendam, com empatia, 'pensa se fosse com você'. Se ela já sofreu a violência, superou o medo, a vergonha, já conseguiu sair de casa e dar um jeito de chegar na unidade de saúde, o mínimo que ela precisa é ser atendida de modo digno, sem julgamentos ou piadinhas".
Luciana Azambuja afirma que as políticas públicas paras as mulheres são voltadas principalmente aos municípios do interior. “No interior, não há todos esses serviços especializados como os oferecidos pela Delegacia de Atendimento à Mulher e, principalmente, pela Casa da Mulher Brasileira aqui em Campo Grande”.
A feminista e acadêmica de Ciências Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Fernanda Campos acredita que os profissionais que estão ali para aprender devem estar motivados a fazer um atendimento mais humanizado. “Não adianta se submeter a um treinamento só para entrar por um ouvido e sair pelo outro. Você tem que estar de cabeça aberta e acreditar naquilo que está sendo ensinado, refletir sobre aquilo. Então, eu acho que, por meio do curso e também de conversas e debates, a pessoa tem que, acima de tudo, querer ouvir e não julgar assim de primeira, não ser preconceituosa”.
A estudante ainda ressalva que a qualificação deve ser feita no momento em que o profissional de saúde é admitido em uma unidade de atendimento à população. Ela salienta que seria essencial educar permanentemente agentes policiais e quaisquer outros funcionários que trabalham no atendimento à mulher, principalmente no que se refere às denúncias e processos judiciais.
Serviço
Em casos de violência contra a mulher, denuncie na Central de Atendimento à Mulher, por meio do Ligue 180. A ligação é gratuita e anônima.