Mato Grosso do Sul registra aumento no número de denúncias por violação dos direitos de pessoas com deficiência no Disque 100, em comparativo entre 2016 e 2017. De acordo com o levantamento do Ministério dos Direitos Humanos (MDH), responsável pela divulgação dos dados do programa, foram registrados 149 casos em 2016 e 205 em 2017. Nos relatos coletados pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, é possível registrar mais de uma categoria de violência por ligação. No total, Mato Grosso do Sul teve 300 vítimas, 112 do sexo feminino, 129 do sexo masculino e 59 não informados.
Entre os tipos de violação mais relatados em Mato Grosso do Sul estão negligência (242); violência psicológica (189) e abuso financeiro e econômico/violência patrimonial (102). No último ano, entre os maiores índices de violação, destaca-se no estado a negligência por amparo e responsabilização (120) e por medicamentos/assistência a saúde (70). A categoria violência psicológica recebeu 94 relatos sobre hostilização e 80 de humilhação. Abuso financeiro contra pessoas com deficiência apresentou 41 denúncias de retenção de salário/bens e 16 sobre expropriação/apropriação de bens.
O Brasil ratificou em 2009 a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, adotado pela Organização das Nações Unidas (ONU). O propósito é assegurar o exercício dos direitos e liberdades fundamentais para a pessoa com deficiência, assim como o respeito pela dignidade. De acordo com o Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, a atenção volta-se para os obstáculos sociais que essa população enfrenta. “Preocupados com o fato de que, não obstante esses diversos instrumentos e compromissos, as pessoas com deficiência continuam a enfrentar barreiras contra sua participação como membros iguais da sociedade e violações de seus direitos humanos em todas as partes do mundo”.
O coordenador de Apoio à Pessoa com Deficiência de Campo Grande (Caped), David Marques afirma que as barreiras arquitetônicas e sociais favorecem o enclausuramento da pessoa com deficiência. “As dificuldades são várias. A calçada, a falta do piso tátil, o transporte coletivo, o acesso à educação, à saúde e à habitação. É um conjunto de situações que nós, enquanto coordenadoria, trabalhamos para melhorar. Mas ainda falta muito para chegar aonde a gente deseja, tendo como base a Lei Brasileira de Inclusão”.
A Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência define pessoa com deficiência como aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial. Segundo a coordenadora Nacional de Educação e Ação Pedagógica da Federação das Apaes (Fenapaes), Fabiana Maria de Oliveira a sociedade precisa se organizar para remover quaisquer obstruções. “O que está pesando na vida da pessoa com deficiência é a existência de barreiras para ela participar. Por exemplo, se não tiver cidade com urbanização adequada com base na Lei da Acessibilidade, até que ponto as pessoas vão estar ou estarão totalmente incluídas?”.

O Centro Especializado em Reabilitação (CER) da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Campo Grande - MS funciona com superlotação. Segundo a assessora de imprensa da instituição, Júlia Verena o local atende 3.800 pacientes por mês, o que corresponde a 3.100 atendimentos acima do que é previsto pela Portaria GM/MS 793 de 24 de abril de 2012 e Portaria GM/MS 835 de 25 de abril de 2012. A unidade faz parte do programa federal Viver Sem Limites e compõe a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência em Mato Grosso do Sul.
A coordenadora de Educação e Ação Pedagógica da Fenapaes, Fabiana Maria de Oliveira afirma que a entidade surgiu por causa da dificuldade das famílias em conseguir atendimento especializado para as pessoas com deficiência intelectual e múltipla. “A história da rede e do movimento das Apaes começou com a atuação dos parentes, com o protagonismo delas. Foram elas que se juntaram, com o apoio de profissionais, e criaram a primeira Apae no Brasil de 1954”. A assessora de imprensa da Fenapaes, Júlia Verena aponta que, atualmente, há 2.178 associações no Brasil e mais de 350.000 famílias encontram-se atendidas na rede.
A criação do Clube de Mães por responsáveis pelos alunos atendidos no Centro de Educação Especial Girassol (CEDEG/Apae) reforça a participação da família nas políticas inclusivas. A presidente do Clube, Maria Ferreira afirma que o grupo possui em torno de 100 associadas que aprenderam a conviver com os problemas e com a deficiência dos filhos. “O clube funciona hoje em frente a escola e as mães que participam são sócias, cada uma no seu período. Lá elas têm um espaço para ficar e acesso a cursos para que as mães se capacitem”.
Maria Ferreira ressalta que as políticas públicas precisam considerar todos os níveis de deficiência, inclusive as que apresentam características menos visíveis. “Tem que melhorar um pouco, um olhar diferenciado, porque as pessoas veem muito a deficiência pelo grau ou diz que o deficiente é somente o cadeirante ou aquele paralisado cerebral. Ele não olha num todo, não olham que uma pessoa com Síndrome de Down, como a minha filha, é uma deficiente”.
A coordenadora de Educação e Ação Pedagógica da Fenapaes, Fabiana Maria de Oliveira esclarece que a inclusão social é só um dos aspectos previstos pelas leis voltadas às pessoas com deficiência. “A legislação brasileira abre para a inclusão social, na educação, na saúde, no trabalho, em tudo. Mas existe isto atualmente? Toda lei precisa de decreto para ser regulamentada. Não existe, o que precisa então é aplicabilidade da legislação nos diversos setores do poder público”.
A Lei 13.585, que institui a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, foi sancionada em 26 de dezembro de 2017. Fabiana Maria de Oliveira explica que a data era comemorada por entidades e associações desde 1964, quando foi criada a Semana do Excepcional. “Na década de 1960, ela foi um decreto do presidente Castelo Branco. Com o presidente Fernando Collor (PTC-AL), o decreto foi extinto. E agora foi retomada porque nós lutamos para ser oficial. Embora extinta, todas as instituições, principalmente da rede Apae, continuaram mobilizando-se de 21 a 28 de agosto para debates, discussões, estudos e eventos para dar visibilidade para essas pessoas e suas famílias”.

(Foto: Julisandy Ferreira)
A diretora pedagógica do CEDEG/Apae, Claudeice Mendes explica que ouvir as famílias, prestar atenção e entender as necessidades das pessoas com deficiência fará com que os direitos delas sejam garantidos. “Ao dar voz, você consegue traçar uma linha de trabalho, ter um planejamento e é diante do que eles trazem que a gente avança dentro de muitas ações. Só nós enquanto profissionais, com o nosso conhecimento, não damos garantia de nada. A nossa luta é para que eles sejam incluídos dentro de uma sociedade”.